[ Excertos de um interessante artigo com entrevista inclusa a João Paulo Cuenca - escritor revelação carioca - publicada na última edição do Ípsilon (sexta, 27 de Fevereiro) a propósito do lançamento em Portugal do seu último romance "O Dia Mastroianni" ]
A mãe deste carioca ensinou-o a ler, em casa, com a ajuda de bloquinhos de madeira com letrinhas. Por isso quando João Paulo entrou no colégio de freiras, onde estudou, já sabia ler. Rapidamente percebeu que tinha que "driblar" as freiras da biblioteca para ler o que elas não queriam que ele lesse, e costuma dizer que foi ao ler Dostoiévski que desgraçou a vida para sempre. "No meu grupo de amigos no Brasil, temos essa piada interna, esse calão particular do dia Mastroianni. É quando o dia está muito divertido, inesperado e as coisas tomam um rumo glamoroso. Se você se vê numa cobertura de um hotel, tomando 'dry martini', numa festa de modelos da agência Elite de Nova Iorque isso é um dia Mastroianni", explica. "Toda a vez que isso acontecia a gente falava: 'Olha está ficando Mastroianni o nosso dia'. E no meio desse conceito, de desperdiçar as horas, comecei a engendrar essa narrativa que durasse um dia e que contasse a história de dois amigos bastante adolescentes e idiotas, pretensos artistas que vivessem de uma maneira episódica o percurso por uma cidade."
Além da referência ao cinema a que se chega pelo título, o livro está salpicado de brincadeiras e de referências literárias. O narrador, Pedro Cassavas, é um pretenso artista, cheio de planos e de intenções mas que não realiza nada. Cuenca traça o retrato de uma geração que tem muitos projectos e que não faz nada. As personagens brindam aos dândis precoces, aos escritores sem livros, aos músicos sem discos, aos cineastas sem filmes. "Pessoas que têm planos e pretensões e têm todo um discurso já pronto mas não têm obra."
"Oito e Meio", de Fellini e "O Acossado" de Godard deslizam pelo romance. São referências para algumas pessoas da geração de que o brasileiro faz parte, aquelas que gostavam de ter vivido há 40 anos. "Existe uma nostalgia roubada que eu tenho e conheço muita gente que tem, uma nostalgia de uma época que não se viveu. Tenho saudades dos anos 60 quando vejo certos filmes. Nunca vivi nem nunca vou viver aquilo. Vivo num mundo muito mais sem graça. E o meu livro tem um pouco disso, dessa ressaca".
E depois há a forma como descreve as mulheres nos seus livros "bombas de hormônio cada vez menos exigentes e mais desesperadas". "O meu olhar sobre as mulheres é muito infantil. É muito primário. É um horror", afirma quase envergonhado. "Perco muito tempo da minha vida pensando no que pensa uma mulher porque sou infantil. O texto pode ser maduro, mas o ponto de vista é de uma criança chocada".
" Essa coisa com as mulheres é porque eu tenho um ponto de vista infantil e fascinado. Um homem não conhece uma mulher. Jamais. É uma ilusão, a fantasia de você achar que vai desconfiar aquilo que uma mulher está pensando. É impenetrável. E você pode perder a sua vida nisso. É o que eu faço. E aí você inventa. Você conhece inventando."
" Essa coisa com as mulheres é porque eu tenho um ponto de vista infantil e fascinado. Um homem não conhece uma mulher. Jamais. É uma ilusão, a fantasia de você achar que vai desconfiar aquilo que uma mulher está pensando. É impenetrável. E você pode perder a sua vida nisso. É o que eu faço. E aí você inventa. Você conhece inventando."
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